sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Infância - O bonzinho e O mauzinho

Geralmente pais não ensinam que as pessoas mudam. Eles ensinam que as pessoas crescem, mas não que mudam. Ensinam que o fulano é bom e beltrano é mal. Ensinam as crianças a ignorar quem as faz mal e manter por perto quem as faz bem com a frase “ame quem te ama” que é tão difundida quanto equivocada, pois:
1. Se alguém está dizendo quem você tem que amar, já deixa de ter algo fundamental para que seja amor: liberdade.
2. A frase te conforta com o amor de alguém que já te ama e te ordena a amar igualmente esse alguém. Para quê amar pessoas estranhas? Fique no seu mundinho que vai ficar tudo bem.
3. É contraditório, pois se você ama alguém, esse alguém terá que te amar, porque você o ama e ele tem que amar quem ama ele. Mas você não pode amá-lo porque você só pode amar quem te ama e ele não te ama. Então nem perca tempo investindo.

E ainda dizem que isso é amor verdadeiro. Isso é simplista, uma falsa dicotomia: verdadeiro ou falso. Claro, isso se tratando de pessoas. Pessoas são mutáveis!

Pais não costumam ensinar as crianças que pessoas mudam, mas ensinam quem são os bons e os maus como se já conhecessem todas as complexidades de todas as pessoas do mundo! Surgem com o discurso de que “eu tenho o dobro/triplo na sua idade e sei de tudo, seu pirralho”, inconscientemente, obrigando o filho a depender de uma única fonte de sabedoria. Ou aquele outro discurso de “não interessa, eu que mando” ensinado-o a não questionar uma autoridade, seguir uma hierarquia, mesmo que não faça sentido. É sério que tem pai que quer isso para o filho? Um ignorante que não questiona só porque é uma autoridade?

Isso resulta na incapacidade das crianças de analisarem mais friamente as pessoas, entendê-las e não julgá-las. O dicionário tem muitas páginas por algum motivo: Está cheio de palavras que definem as coisas. Deixe-me dar um exemplo:

Chamam uma pessoa que foi pega na mentira de mentirosa, mas todas as pessoas mentem, nem que seja para encobrir uma festa surpresa. Não há como definir mentirosos de verdade dos mentirosos de mentira porque a mentira é uma ação, não uma característica. Ninguém nasce mentiroso ou é mentiroso 24h por dia. Mas então por que as pessoas mentem? Pensando nas diversas respostas possíveis notaremos uma coisa em comum entre elas: medo.

Ou seja, há uma palavra para definir a atitude dessa pessoa. Ela não é má, mentirosa, serpente, naja, maquiavélica... Ela só está com medo e, no máximo, tem baixa autoestima o suficiente para acreditar que a verdade nunca será o bastante.

Ou chamar uma pessoa que não está satisfeita com a vida que tem e aspira por mais de interesseira.

Sem delongas a cerca de exemplos (penso que a ideia já ficou clara), não existe pessoas imutáveis. Mas as pessoas sempre quererem tachar algo de mau, sempre querem inventar mais um termo pejorativo, já não bastasse os tantos que conhecemos. Parece que nunca estão satisfeitas com o ódio que têm que precisam criar novas formas de odiar.

Há uma quantidade absurda de jovens que têm medo de mudarem de ideia porque isso significaria “trair seus princípios” (não é como se um jovem tivesse certezas absolutas a ponto de pensar que é possível “se trair”), pois apenas coisas podem ser mudadas, atualizadas e descartadas. E a realidade é bem outra: pessoas chegam de um jeito, se transformam e partem de outro jeito. E devemos deixá-las partir sem rancor, sem apego, sem chantagens.

Essa ideia de que pessoas são imutáveis faz com que os jovens entrem em conflito consigo mesmos, pois até ontem estava definido que eles eram crianças boazinhas e, do nada, precisam lidar com uma nova definição: “aborrecentes”. Mas eles não foram educados para lidarem com novas definições ao mesmo tempo em que foram educados para aceitarem definições simplistas. Então ficam naquele dilema de tentar provar que ainda se encaixam na definição de bonzinhos ao mesmo tempo em que não existem flexibilidade e complexidade nas definições e se estão dizendo que todo adolescente é pentelho, então deve ser.


Não são os jovens que naturalmente fazem besteiras. São os pais que os ensinam que jovens só fazem besteira porque no momento em que isso fica pré-estabelecido, os pais não precisam mudar em nada seu modelo de educação. Alguns, inclusive, se ofendem com essa sugestão, esquecendo que são pessoas suscetíveis a erros também. Se colocam num pedestal para que não sejam refutados pelos filhos e dizem que é natural.

Ao contrário do que dizem, pais e filhos não são “todos iguais, só muda o endereço”. Os modelos de educação é que são “todos iguais, só muda o endereço”. Então é só mudar esse modelo.

A não ser, é claro, que se ache normal adultos vivendo intrigas e estresses, tentando, incansavelmente, se provar a todo instante, se apegando cada vez mais às suas próprias ignorâncias, não solucionado os problemas, mas naturalizando-os para que ninguém conteste suas infelicidades.

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