sexta-feira, 15 de abril de 2011

A História do Lápis Preto (Parte II)

Outro desenho assinado pelo aluno com seu habitual lápis preto deixou a professora preocupada: o sol era negro, as flores eram negras... Até as pessoas eram apenas vultos pretos no papel. Não tinha marrom, não tinha rosa, não tinha amarelo... Só preto.

A professora achava aquilo triste e pensava que algo estava errado com aquela criança. Por quê? Não sei! Talvez ela fosse racista e tivesse preconceito com preto! Tudo bem, essa piada foi infame... Mas de fato, geralmente é assim: se nos vestimos de preto somos pessoas introvertidas, com fobias e provavelmente sofremos algum trauma, que quer disfarçar e esconder nossas inseguranças... Então, se uma ingênua criança, simplesmente, sempre pinta desenhos de cor preta, é óbvio que futuramente ela tentará cometer suicídio, planejará tortura contra as pessoas de quem não gosta, matará por prazer, dirá que a vida é uma droga, será uma assassina psicótica compulsiva... A lógica é imbatível, é claro!

Com o passar dos dias a professora não aguentou mais segurar aquela angustia só para ela e teve a brilhante ideia de falar com a mãe do garoto. Ela disse que as crianças têm que usar cores no seu trabalho para mostrar que conseguem sair do "pretinho básico". Elas têm que passar a imagem de que conseguem ver o mundo de outra forma, conseguem imaginar, sentir, pensar, conseguem criar, e sair da sua zona de conforto. Pessoas seguras arriscam no colorido. Se jogam. Pessoas inseguras, preferem ficar no preto. E pessoas inseguras farão qualquer coisa para estarem com pessoas seguras. QUALQUER COISA. Eis o medo.

A mãe preocupada gradeceu a professora e voltou para a casa com o filho. Tirou uns dias de folga para ficar com a criança e observar melhor seu comportamento. Sempre fora uma mãe dedicada, cuidadosa. No primeiro dia de aula ela disse ao filho "cuide bem do seu material, não empreste a ninguém" e agora se sentia culpada por estar ensinando a criança a ser egoísta, malvada, sem poder confiar nos outros, porque um dia eles quebrarão seus lápis coloridos. Mas conforme os dias passavam ela se certificava cada vez mais que a criança era feliz. Não havia traço algum indicando tristeza, insegurança, raiva...

Era seu último dia de folga e a mãe ainda não tinha descoberto nada. Ela não iria conseguir trabalhar sossegada sem tirar aquilo a limpo, então decidiu que faria isso e faria já! Se aproximou toda sem jeito da criança, com medo de respostas, perguntas... Respirou fundo e perguntou:

- Filho, por que tu só usa o lápis preto nos seus desenhos? Tu não gosta das outras cores?

- Mas eu gosto das cores. Eu não gosto é do lápis preto.

- Então por que tu só usa ele nos seus desenhos?

- Para acabar logo com ele! Já tá bem pequeno...

- Mas se tu não gosta dele porque não dá ou joga fora?

- Ué, mãe, tu disse para eu cuidar e não emprestar para ninguém, né?

- Mas a mamãe não sabia que tu não gostava do lápis preto...

- Ah, mas a culpa não é tua se na caixa sempre vem um lápis preto.

Então a mãe riu. Como ela tinha sido tola na sua inteligência. Obviamente, contou o caso para a professora e todos viveram felizes para sempre. Ou pelo menos até se perguntarem o por quê de ele não gostar do lápis preto...

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